Monday, March 23, 2009

SERENA

A noite estava fria. A chuva batia contra o vidro da janela e acabava assustando as crianças que tentavam dormir no quarto. Era inverno. O vento gelado conflitava com o interior aquecido pela lareira. Não havia trovões, mas o barulho da água e do vento estavam ficando insuportáveis. Um uivo ao longe determinava que os lobos também estava sentindo-se conflitados com o tempo. Segundo a avó, lobos não gostavam de chuva. Não saíam na chuva. Não uivavam na chuva. Chuva na primeira semana de inverno era sinal de mau agouro. "Visita indesejada" era como a chamava. Caminhava descalça pelo corredor com piso de madeira. Teve que sair do quarto porque as outras crianças, sues irmãos e irmãs, acordavam cava vez que o vento soprava mais forte. Acabavam atrapalhando-lhe o sono, fato que os elementos da natureza não conseguiam fazer. Iria para a cozinha e esquentaria um copo de leite para tomar. Sentou-se no tamborete enquanto esperava o leite ferver. Estava gelada, deveria ter pegado um casaco para andar por ali àquela hora. O fogo na sala ainda estava aceso e parecia uma boa idéia recostar-se no sofá, tomar o leite e talvez dormir por ali mesmo. Sua mãe não iria se importar. Ela já não era mais criança. Já tinha dezoito. O povo da vila até estava se perguntando por que ainda não havia ficado noiva. O leite ficou pronto e ela foi com o copo se aconchegar às almofadas macias em frente à lareira. Puxou a coberta que sempre ficava no encosto do sofá e se enrolou nela. Tomou o leite, deitou, e ficou de olhos fechados aproveitando o calor e o brilho que o fogo deixava por trás de suas pálpebras fechadas. O fogo por companheiro... Não estava sozinha. Nunca estava sozinha. Era como se a pequena estátua sobre a porta fizesse-lhe companhia constantemente. O fogo... A estátua... Não estavasozinha... Sempre havia mais alguém... O fogo ia apagando lentamente, o vento sopro mais forte e fez a porta bater. A vibração derrubou a estatuazinha no chão e esta se quebrou... Mas ela continuou de olhos fechados... Não estava sozinha... Sentia... Ao longe, o lobo uivou novamente. Com o fogo quase extinto, o frio voltava a tomar-lhe o corpo, mas algo lhe dizia que não estava mesmo sozinha. Podia ouvir passos ecoando no chão de madeira. A presença serena se aproximava. É, não estava mesmo só. Sempre havia alguém por perto. Estava de olhos fechados e de olhos fechados ficou, nada via. Um toque quente em sua testa confirmou a presença que já vinha despontando. A sensação de um corpo ao lado do seu, a fez ter certeza absoluta. O abraço que a envolveu ajudou a acalmar o frio e a aquecer-lhe a alma. Pode dormir. Não estava sozinha, estava quente e confortável. E como sempre, pela manhã, a confusão e agitação voltariam. No meio de tantas pessoas se sentiria sozinha. Mas não iria pensar nisso. O que importava era que agora ainda tinha companhia de verdade. Assim, nunca estava sozinha. Talvez, o segredo seria nunca mais acordar.

EXPECTATIVA

Minha parte favorita é o encontro. Sabe? Quando os dois mocinhos do filme se encontram pela primeira vez... Ou quando o pirata encontra o barco assombrado que estava procurando... Ou ainda, quando o médico encontra a resposta para o caso que do contrário acabaria com a vida de alguém... O primeiro encontro do alienígena com o humano, ou vice-versa. O encontro do colar perdido que recebera da avó. O terceiro encontro: aquele em que por tradição deveria rolar um beijo à porta. Encontrar o caminho de volta pra casa... ou por entre as paredes do labirinto... Encontrar um sopro fresco no deserto... ou um oásis... Em fim: um encontro... E como se não fosse suficiente tudo isso... Vai ao encontro do mar.